Registro minha homenagem ao iluminado Mauricio Kus, falecido recentemente aos 92 anos, que tive o privilégio de conhecer pessoalmente e ter trocado "figurinhas" por anos. Jornalista, produtor, assessor de imprensa e uma verdadeira "enciclopédia cultural", Kus esteve de corpo e alma em acontecimentos cruciais da vida cultural brasileira. Ele, em suas reportagens, assessorias, ou mesmo como anfitrião de visitantes internacionais em São Paulo, acompanhou estrelas de alto quilate e personalidades ilustres. Uma delas foi a lendária Katherine Dunhan, bailarina, coreógrafa, antropóloga e ativista americana, responsável direta pela Lei Afonso Arinos depois que o luxuoso Hotel Esplanada no centro de São Paulo recusou sua hospedagem quando soube se tratar de uma pessoa negra. O projeto de lei do deputado homônimo, que foi criado logo depois do incidente e virou lei um ano depois, em 1951, transformava em contravenção penal qualquer recusa de hospedagem de hotel, matrícula de escola, entrada em estabelecimento comercial ou contratação em empresa por preconceito de raça. Mauricio Kus, que entrevistara Katherine por conta do triste episódio para o "Correio Paulistano", foi um dos mais veementes na cobertura, classificando o ocorrido como "revoltante incidente". Logo depois da entrevista, a americana convidou-o para assistir a matinê dominical no Teatro Municipal, e ele, mesmo perdendo a final da Copa do Mundo entre Brasil e Uruguai ( o famoso "Maracanaço", desastroso momento do nosso futebol), topou na hora - e não se arrependeu. Assim foi na vida: não perdia a oportunidade de participar intensamente de momentos que podiam transformar o mundo a sua volta. Na pioneira "Primeira Exposição Internacional de Histórias em Quadrinhos", de 1951, que exibiu as HQs pela primeira vez no mundo como "obra de arte", lá estava Kus como peça-chave dos bastidores, ao abrir as portas (depois de várias reuniões exaustivas com a diretoria) do Centro Cultura e Progresso no bairro do Bom Retiro, para a realização do evento. Sem ele e sua insistência, os organizadores Álvaro de Moya (seu amigo desde sempre), Jayme Cortez, Reinaldo de Oliveira, Miguel Penteado, Syllas Roberg, e o mundo, não teriam a chance de ver concretizada a primeira exposição de quadrinhos do mundo! Outro momento de pioneirismo foi quando participou como jurado da 1ª Edição do Troféu Imprensa, em 1960. Durante a vida toda, escreveu muito sobre TV, Teatro, Música e principalmente Cinema, em diversos veículos da grande imprensa e alguns mais direcionados, como "O Espetáculo". Quando finalmente se "oficializou" como assessor de imprensa, também revolucionou na profissão e praticamente criou a função de assessor de grandes estúdios cinematográficos no Brasil (e repetiu a dose para as áreas hoteleiras, de aviação e de varejo). Virou um grande divulgador do cinema nacional, incluindo todos os filmes de Walter Hugo Khoury, abriu uma importante empresa de assessoria (PR Comunicação, depois Chaits) e se tornou representante da Braniff International Airways no país. Eu conheci Kus em um evento de comunicação há muito tempo e nos últimos anos trocávamos mensagens ou telefonemas (não tão assíduas, mas pra mim sempre valiosas). Quase sempre me ajudava a achar a saída de algum beco que eu tinha me metido em minhas pesquisas culturais. Em 2015, fez questão de mandar um convite de uma peça de teatro que ele estava produzindo/assessorando em São Bernardo, e que ele sabia ser cidade vizinha minha. Mesmo com um buraco no coração pela partida em 2007 da companheira de vida Sara, colocou sempre seu humor e espontaneidade em patamares elevados e se manteve na ativa até o último momento. Vá em paz, mestre! Grandes astros o aguardam mais uma vez!
Walter Hugo Khoury, Sandra Bréa e Mauricio Kus em 1979 (divulgação/grupo Sandra Bréa/FB)