13 de setembro de 2010

Clausuras, dores e casulos transformadores

Renato Russo na adolescência (Arquivo Pessoal)
Conversando com a Cris sobre o ótimo livro "O Filho da Revolução", do jornalista Carlos Marcelo, que narra a trajetória do fundador da Legião Urbana em paralelo à própria história da capital federal ( Renato e Brasília nasceram no mesmo 1960), comentei que uma das passagens mais intrigantes é aquela em que o jovem Renato Manfredini Jr. é diagnosticado com uma terrível doença chamada epifisíólise, que desgasta ossos e cartilagens a ponto de deslocar o fêmur da bacia. Renato não podia se exercitar e sequer caminhar, o que o imobilizou na cama por dois anos. Para um garoto de 15 anos essa condição certamente é o inferno na Terra, mas nesse caso, acabou se transformando num laboratório de idéias e planos que sedimentaria toda a carreira do futuro compositor. Enclausurado e coberto de dores, Renato criou nesse período uma banda de rock imaginária (42nd Street Band) e uma persona, o vocalista e baixista Eric Russel, que já prenunciava seu futuro nome artístico. Quando curou-se, depois dos 18, todos os rabiscos, rascunhos e estratagemas planejados em seu casulo involuntário, deram a faísca necessária para a formação do seminal Aborto Elétrico e toda a postura rocker que o acompanhou pelo resto da vida. O sofrimento propiciou um plano de vôo milimetricamente estudado.
As biografias não mentem: convalescências, prisões, doenças mobilizantes, acidentes, entre outras rupturas radicais, muitas vezes servem como chaves que evocam vocações, ativam sonhos escondidos e transformam para sempre a vida e a postura dos atingidos.

Típico pôster de Griffin (1968)
Rick Griffin, famoso artista gráfico e quadrinista californiano, era também surfista dos bons e seus primeiros trabalhos traziam toda a cultura surfer para a arte do início dos anos 60, abusando de ondas gigantescas e personagens ensolarados.Até que em 1964, sofreu um grave acidente de carro rumo à São Francisco, onde lesionou seriamente um olho e teve várias cicatrizes permanentes no rosto. A partir daí, o surfista louro e galã Griffin trocou o bronzeado e as bermudas por um tapa olho e uma vasta barba cinza, e mudou totalmente sua concepção artística, que passou a incorporar elementos psicodélicos e darks como caveiras, lagartos cobras e esqueletos. Foi a partir desse terrível acidente que Griffin se encontrou como artista, criou os mais incríveis posters de bandas hippies dos anos 60/70 e pôde virar lenda antes de morrer ( em outro acidente, em 1991), tornando-se ao lado de Stanley Mouse, Victor Moscoso, Alton Kelly e Wes Wilson um dos 'Big Five" da psicodelia.

Tom Jobim mergulhado na música (anos 50)
Tom Jobim era na juventude um exímio esportista, caçador,nadador e mergulhador, até que em uma brincadeira besta na praia, caiu de mau jeito e avariou seriamente as costas. Impedido de praticar esportes, "mergulhou" de vez no piano e na noite. O resto é história.
"O Filho da Revolução" de Carlos Marcelo
Lembrei de três casos, mas com certeza há muitos enredos similares em que uma "avalanche" no caminho abriu clareira para um novo atalho, mais transformador e corajoso que o primeiro. Quem lembrar de outros, é só acrescentar.
Mais sobre:
http://www.renatorussoolivro.com.br/home.asp
http://www.rickgriffinink.com/
http://passagemcultural.blogspot.com/2009/01/em-1927-nasceu-o-maestro-soberano.html

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