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foto arquivo pessoal |
Mais uma pessoa essencial se vai e eu não posso deixar de prestar minha homenagem. Mylton Severiano, o Miltaynho, era um dos últimos moicanos daquela brava turma que fundou a Realidade e mudou todo o jornalismo que se faria a partir dali. Turma que continuou aprontando pelas décadas adiante, sempre pendendo pra esquerda e pro jornalismo independente (ou quase): Bondinho, Grilo, Ex-, A Nação, Brasil Extra, Extra Realidade Brasileira, Caros Amigos. Miltaynho tava sempre com um pé nessas redações mais libertárias e com o outro na dita imprensa tradicional. Passou pela Folha de S.Paulo, Estadão, Jornal da Tarde, Quatro Rodas, TV Globo, TV Tupi, TV Cultura, Aqui São Paulo, TV Abril, A Nação, TV Bandeirantes, Panorama de Londrina, O Jornal, entre tantos outros veículos. Fundador, colunista e colaborador por anos na Caros Amigos, sob a batuta de seu grande amigo e um dos cabeças da velha turma, Sergio de Sousa, o Sergião, morto em 2008, acabou editor-executivo da publicação após a morte deste, até ser despedido pouco menos de uma ano depois, segundo a direção, por discordâncias editoriais. Em sua gestão, muitos funcionários pediram demissão por não entrarem em sintonia com seu jeito expansivo e direto de dirigir e até muitas vezes explosivo. Não vou entrar nos méritos ou deméritos aqui, mas imagino a bomba que ficou em seu colo, após perder o amigo de longa data e ainda substituí-lo numa função já emoldurada e sacramentada por ele. Severiano sempre mostrou a cara e nunca fugiu de polêmica, características que estão rareando e muito nas novas gerações redacionais de hoje. Durante e depois de Caros Amigos, Mylton permaneceu como editor de texto do excelente Almanaque Brasil de Cultura Popular, distribuído em voos da TAM. No final dos anos 90, foi indicado para o Prêmio Jabuti de Literatura, na categoria reportagem pelo seu elucidativo livro "Se Liga - O Livro das Drogas!". Em sua incursão pela literatura, lançou outros livros bem interessantes: a biografia do Papa João XXIII, "Um Século de Boa Vida", em parceria com Jorginho Guinle; 'Paixão de João Antônio'; duas obras que vão fundo em marcos da imprensa brasileira: "Nascidos para Perder - História do Jornal da Família que Tentou Tomar o Poder pelo Poder das Palavras", sobre o Estadão, e "Realidade - História da Revista que Virou Lenda". E outro, de 2011, que mergulha criticamente na postura atual da imprensa: "Crime de Imprensa - Um Retrato da Mídia Brasileira", ao lado de seu chapa Palmério Dória, tão chapa quanto o fotógrafo e editor de fotografia Amâncio Chiodi, velho parceiro de redações que saiu ( ou foi saído) no mesmo dia da Caros Amigos. Miltaynho tinha um texto primoroso - leve, solto, elegante, mas ao mesmo tempo enérgico e cheio de tensão. E acho que ele era como seu texto em sua rotina eclética, sempre cheia de projetos, paixões, comentários, críticas, debates, denúncias, interações com o mundo. Outra faceta sua era a música: formou-se acordeonista pelo Conservatório de Musical Santa Cecília, de Marília. E entre suas grandes façanhas no jornalismo, a matéria escrita com outros colegas do Ex- sobre a morte de Vladimir Herzog nos porões da ditadura - o jornal foi o único a escancarar o caso na época. O título, "Liberdade, Liberdade, Abra as Asas sobre Nós" foi idéia sua. No Facebook, tive a honra de constar em sua lista de amigos, e sempre acompanhava suas tiradas rápidas, suas polêmicas salutares e sua visão panorâmica sobre tudo o que era relevante a sua volta. Nos últimos dias de abril, postou foto comendo banana, mostrou uma reportagem recente da revista Época sobre Roberto Carlos na ditadura ( com direito e condecoração e outras aproximações), linkando comentários sobre a polêmica das biografias, postou sobre fotografia, uma de suas paixões, e falou sobre o pastor Feliciano, ministro Barbosa e o PSDB (assuntos que não faltavam em suas entradas). Estava mais Miltaynho do que nunca, até que após um breve intervalo em maio, vem essa notícia de seu falecimento, que veio como um furacão para seus admiradores e colegas. A velha turma certamente o está esperando, com uma cadeira especial em alguma redaçãozinha teimosa incrustada em um desses planos próximos.
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