Amiden ( com sua guitarra de três braços) no O Terço |
JORGE AMIDEN: UMA HISTÓRIA RESUMIDA
Nélio Rodrigues
Esquecido num sítio na
periferia do Rio, o compositor, guitarrista e fundador de O Terço e do Karma,
Jorge Amiden, tenta recuperar a saúde abalada pelo uso de drogas e das
(pouquíssimas) viagens que fez com LSD no início dos anos 1970. "Foram
muito boas, mas custei a voltar delas", diz o nosso afável Syd Barrett.
Jorge é o compositor da inesquecível 'Tributo ao Sorriso' (em parceria com
Hinds) e de tantas outras canções geniais do repertório de O Terço (1970 a
1971) e do Karma (1972). Era ele o principal arquiteto dos vocais harmoniosos
de ambas as bandas. Além do mais, gravou um antológico LP com o Karma,
participou do disco 'Sonhos e Memórias' de Erasmo Carlos e integrou a banda de
Milton Nascimento. Depois, com o cérebro golpeado, se afastou dos palcos. Seguiu-se,
então, um longo e indesejável ostracismo. Mas Jorge quer voltar, quer a música
"viva" de volta a sua vida. E nós, órfãos de sua brilhante
musicalidade, torcemos para que ele encontre o fio da meada, a luz no fim do
túnel, a glória de um final feliz.
Jorge Geraldo Amiden nasceu em Campinas, SP, no dia 9 de janeiro de 1950. Com três anos de idade, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, de onde partiu para Brasília, em 1962, quando seu pai, Jamil Amiden, se elegeu deputado federal.
Por conta dos caprichos da mãe, o menino Jorge começou a estudar piano clássico, com eventuais desvios em direção à bossa nova. Levava jeito, tinha bom ouvido musical e uma especial sensibilidade para a música. No entanto, o piano só resistiu até Jorge entrar em contato com a música dos Beatles. Encantado com o conjunto inglês, que invadia o mundo com seus 'yeah yeah yeahs', Jorge trocou o piano pelo violão, Bach por Lennon e McCartney. Mas não sossegou até conseguir uma guitarra - uma Sound de 12 cordas.
Ainda em Brasília, ajudou os amigos Bina, Edson e Armandinho a montar uma banda. Na verdade, uma das primeiras de Brasília e que veio a ser batizada como Os Primitivos. Amiden, porém, não fez parte do grupo, já que mais uma mudança se encarregou de afastá-lo da cidade ao mesmo tempo que o trouxe de volta ao Rio, no início de 1967.
Amiden chegou decidido a montar sua própria banda. Com Jorge Roberto, na guitarra e vocal, Guilherme Cataldi, no baixo, e Sérgio, na bateria, Jorge criou Os Medievais e logo entrou no circuito de bailes da cidade. No repertório, muito Beatles e Byrds, além de temas de sua autoria.
Já com Vinícius Cantuária ocupando o posto de crooner da banda, os Medievais gravaram um compacto simples para a Diacuí Discos. Num lado, gravaram a otimista 'Hey de Vencer', uma das primeiras composições de Amiden. No outro, serviram de banda de apoio para a cantora Therezinha Côrtes, que colocou no acetato mais uma canção de Amiden: 'Rosa'. A pequena gravadora, no entanto, confeccionou apenas 10 cópias em acetato que mandou distribuir para algumas estações de rádio a fim de testar o potencial dos desconhecidos artistas. Como não aconteceu nada, a companhia não investiu na prensagem do disco.
O grupo seguiu tocando em bailes e acompanhando gente como os cantores Edson Vander e Serguei. Aliás, era o grupo favorito de Serguei, como conta Mário, irmão de Amiden. Mário, por sinal, logo se tornaria o novo baixista da banda. Sua entrada coincidiu com o processo de reformulação do grupo engendrado por Jorge Amiden. Os Medievais deixaram então de existir, entrando em cena o Joint Stock Co., um septeto inicialmente formado por Jorge Amiden (guitarra de 6 e 12 cordas, violão e vocal), o futuro baterista do Peso, Geraldo D'Arbilly (guitarra e vocal), João (bateria), Mário (baixo), Renato Terra (teclado e vocal), Vinícius Cantuária (vocal) e Jorge Roberto Sá (vocal). O ano de 1968 estava em progresso.
Nasce o Terço
Jorge queria uma banda tão boa quanto os Analfabitles ou The Outcasts, mas seguindo estilo próprio. E o Joint Stock Co. tinha nos vocais uma de suas melhores armas. Afinal, haviam cinco para dividir as vozes. Com o instrumental também afiado, a banda encarou os Analfabitles no palco do Casa Grande e, na Zona Norte, dividiu vários shows com as principais bandas da região, os Red Snakes e os Famks (futuro Roupa Nova).
No início de 1969, com a saída de Mário, que foi estudar teatro, e de Jorge Roberto Sá, o Joint Stock Co. agregou Sérgio Magrão e César de Mercês. Mas a nova fase não foi muito longe. Magrão, que integraria aquela clássica formação de O Terço, com Flávio Venturini, Sérgio Hinds e Luiz Moreno, teve que servir o exército, deixando o grupo capenga.
Insatisfeito com a situação, Jorge se encontra com o guitarrista Sérgio Hinds e com o baixista Robertinho (ambos do trio Os Libertos), a fim de tê-los como parceiros em sua nova empreitada. Da conversa, resulta porém um reformulado Os Libertos, que vira um quinteto com a exclusão de seu baterista e a entrada de Jorge, Vinícius e João (todos ex-integrantes do Joint Stock Co.). Mas, ao longo do ano de 1969, vários acontecimentos levariam o grupo a se transformar no trio que se lançaria pela etiqueta Forma (da Philips); teria participações memoráveis em festivais; e se consagraria, mais tarde (e com mudanças em sua formação), como uma das maiores bandas do rock brasileiro, O Terço.
Para abreviar uma longa história, o grupo seguiu para Corumbá, MS, onde passou meses se apresentando numa boate local, com esticadas eventuais à Bolívia e Campo Grande. Mas João e Roberto não ficaram muito tempo por lá. Mário voltou a assumir o baixo, posição que ocuparia temporariamente até o retorno do grupo ao Rio, no início de 1970. O fato é que os remanescentes Jorge, Sérgio e Vinícius já tinham um compromisso agendado com Paulinho Tapajós, com quem Sérgio Hinds se encontrara numa breve visita ao Rio. Paulinho estava começando a trabalhar com produção na Philips e mostrou-se interessado em ouvir o grupo.
Contudo, como o nome Os Libertos não havia sido do agrado de Paulinho, inclusive por soar desafiador em plena ditadura, o grupo resolveu se auto-intitular Santíssima Trindade. Enquanto ainda estavam em Corumbá, num encontro do grupo com o Padre Ernesto, velho conhecido da família de Amiden, ouviram dele que Santíssima Trindade não era um nome adequado para uma banda de rock. Na verdade, o padre deu um tremendo esporro (desculpe, Padre) em Jorge por causa disso. Quando acabou o sermão, olhou para o rosário que segurava nas mãos e disse: "Que tal batizar a banda com o nome O Terço?".
Embora Jorge tenha gostado do nome, Santíssima Trindade prevaleceu até cerca de abril de 1970, quando o primeiro LP do trio já estava quase pronto para ser lançado. Mas, por conta de um veto atribuído à censura, a banda finalmente passou a adotar o nome defendido por Amiden, O Terço, em substituição ao censurado Santíssima Trindade.
Junto com o novo epíteto, veio o LP de estréia, o primeiro e único de Amiden com o Terço (Forma VDL 116). Amiden assina nove de suas 12 faixas. Cinco em parceria com Hinds e as demais com diferentes parceiros. Um dos destaques é o apurado vocal do trio, preocupação constante de Jorge, cuja voz, em tom mais alto, completava o terceto.
Com um LP nas costas e o benefício de excelentes apresentações nos prestigiados festivais de Juiz de Fora (em junho de 1970) e no Internacional da Canção Popular (em outubro de 1970), a ascenção de O Terço foi muito rápida. No primeiro, venceram o certame com uma canção de Guttemberg Guarabyra e Renato Corrêa, 'Velhas Histórias'. E no segundo (o V FIC), obtiveram o 9o lugar com a lindíssima 'Tributo Ao Sorriso', de Amiden e Hinds.
Em 1971, seguindo no embalo dos festivais, com 'Mero Ouvinte', de Amiden e Cézar de Mercês, o Terço levou o prêmio de melhor arranjo (de Amiden) do IV Festival de Juiz de Fora. Já no VI FIC, o grupo obteve o 7o lugar com 'Adormeceu', também de Amiden e Cézar de Mercês. Foi nesse FIC que o quarteto (Cézar já fazia parte do grupo) apresentou ao público seus novos instrumentos: uma guitarra de três braços (tritarra) e um violoncelo eletrificado. A 'tritarra' foi idealizada por Jorge. Ele queria explorar diferentes timbres e possibilidades sem precisar ficar trocando de instrumento durante as apresentações. Sérgio entrou na onda de Amiden e também quis inovar, introduzindo o violoncelo eletrificado. Talvez assim os holofotes não apontassem apenas para Jorge.
Estranhamente, os desentendimentos começaram a brotar no núcleo do grupo, criando um antagonismo entre Sérgio e Amiden. Nessa época, Jorge Amiden era quem mais sobressaía, certamente gerando ciúme nos companheiros. Aos poucos, começou a se sentir isolado dentro do grupo. Sérgio e Vinícius, por exemplo, queriam enveredar pelo rock mais pesado e isso contrariava os desejos de Amiden. Além disso, Sérgio Hinds decidiu registrar a marca 'O Terço' em seu nome e sem o conhecimento de Amiden.
A atitude de Sérgio e dos companheiros deixou o guitarrista profundamente abalado. Encostado na parede, não teve alternativa senão largar o grupo que ajudou a fundar e lhe dar uma cara. "Fiquei traumatizado", diz Amiden depois de tanto tempo. Na verdade, um trauma jamais superado e de graves conseqüências, a começar pelo uso cada vez mais freqüente das drogas em sua fase pós-Terço.
O raro Karma
Todavia, Amiden logo encontrou novos parceiros. Com Luiz Mendes Junior (violão e vocal) e Alen Cazinho Terra (baixo e vocal), irmão de Renato Terra, o guitarrista daria início a sua trajetória de pouco mais de um ano como líder do Karma. Ramalho Neto, da RCA, não teve dúvidas em contratar a banda antes mesmo de ouví-la. Reconhecia o talento de Amiden e antevia um belo disco do Karma para a RCA.
E foi o que aconteceu. Pouco tempo depois, a RCA distribuía na praça o LP homônimo do Karma, uma obra antológica que merece constar de qualquer lista dos melhores discos da história do rock brasileiro. Com uma sonoridade predominantemente acústica servindo de base para a primorosa vocalização do trio, 'Karma' é recheado de canções brilhantes, como 'Do Zero Adiante' (Amiden e Mendes Junior), 'Blusa de Linho' (Amiden e Rodrix) e a revisitada 'Tributo Ao Sorriso' (Amiden e Hinds). Esta, levada quase até seu final em a capela, servia para realçar ainda mais a força vocal do conjunto. Vale destacar a participação do baterista Gustavo Schroeter (então integrante da Bolha), que ajudou a abrilhantar o disco com sua batida sempre consistente, arrojada e precisa.
E foi com Gustavo na bateria que o Karma fez o show de lançamento do disco no Grajaú Tênis Clube. Lamentavelmente, este pequeno tesouro concebido por Amiden jamais foi reeditado. Possivelmente hiberna nos arquivos da RCA desde o seu lançamento, em 1972, como hibernam tantas outras obras importantes nos arquivos das gravadoras brasileiras.
Em sua curta vigência sob a liderança de Amiden, o Karma ainda participou do VII Festival Internacional da Canção Popular, em setembro de 1972. Foi quando defendeu 'Depois do Portão' (Amiden e Mendes Junior). Em 1973, nos primeiros meses do ano, durante um show no Clube de Regatas Icaraí, em Niterói, depois de misturar bebida com drogas, Amiden perde o controle do próprio cérebro. O solo de guitarra parece interminável... Depois, sentado à beira da praia com Mário, se perde em plano existencial paralelo, vagando inseguro e solitário pelo lado escuro da lua.
Jorge só encontra a saída do enovelado e desconhecido labirinto no dia seguinte, quando percebe que o mundo não é mais o mesmo, o Karma não é mais o mesmo, a música não é mais a mesma...E nem sua vida seria mais a mesma. Dos palcos, se afasta...para na calma do tempo, quem sabe uma luz como guia, em dado momento, conceda algum dia seu retorno sereno.
Agradecimentos: Jorge Amiden, Mário Amiden e Mendes Junior.
Jorge Geraldo Amiden nasceu em Campinas, SP, no dia 9 de janeiro de 1950. Com três anos de idade, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, de onde partiu para Brasília, em 1962, quando seu pai, Jamil Amiden, se elegeu deputado federal.
Por conta dos caprichos da mãe, o menino Jorge começou a estudar piano clássico, com eventuais desvios em direção à bossa nova. Levava jeito, tinha bom ouvido musical e uma especial sensibilidade para a música. No entanto, o piano só resistiu até Jorge entrar em contato com a música dos Beatles. Encantado com o conjunto inglês, que invadia o mundo com seus 'yeah yeah yeahs', Jorge trocou o piano pelo violão, Bach por Lennon e McCartney. Mas não sossegou até conseguir uma guitarra - uma Sound de 12 cordas.
Ainda em Brasília, ajudou os amigos Bina, Edson e Armandinho a montar uma banda. Na verdade, uma das primeiras de Brasília e que veio a ser batizada como Os Primitivos. Amiden, porém, não fez parte do grupo, já que mais uma mudança se encarregou de afastá-lo da cidade ao mesmo tempo que o trouxe de volta ao Rio, no início de 1967.
Amiden chegou decidido a montar sua própria banda. Com Jorge Roberto, na guitarra e vocal, Guilherme Cataldi, no baixo, e Sérgio, na bateria, Jorge criou Os Medievais e logo entrou no circuito de bailes da cidade. No repertório, muito Beatles e Byrds, além de temas de sua autoria.
Já com Vinícius Cantuária ocupando o posto de crooner da banda, os Medievais gravaram um compacto simples para a Diacuí Discos. Num lado, gravaram a otimista 'Hey de Vencer', uma das primeiras composições de Amiden. No outro, serviram de banda de apoio para a cantora Therezinha Côrtes, que colocou no acetato mais uma canção de Amiden: 'Rosa'. A pequena gravadora, no entanto, confeccionou apenas 10 cópias em acetato que mandou distribuir para algumas estações de rádio a fim de testar o potencial dos desconhecidos artistas. Como não aconteceu nada, a companhia não investiu na prensagem do disco.
O grupo seguiu tocando em bailes e acompanhando gente como os cantores Edson Vander e Serguei. Aliás, era o grupo favorito de Serguei, como conta Mário, irmão de Amiden. Mário, por sinal, logo se tornaria o novo baixista da banda. Sua entrada coincidiu com o processo de reformulação do grupo engendrado por Jorge Amiden. Os Medievais deixaram então de existir, entrando em cena o Joint Stock Co., um septeto inicialmente formado por Jorge Amiden (guitarra de 6 e 12 cordas, violão e vocal), o futuro baterista do Peso, Geraldo D'Arbilly (guitarra e vocal), João (bateria), Mário (baixo), Renato Terra (teclado e vocal), Vinícius Cantuária (vocal) e Jorge Roberto Sá (vocal). O ano de 1968 estava em progresso.
Nasce o Terço
Jorge queria uma banda tão boa quanto os Analfabitles ou The Outcasts, mas seguindo estilo próprio. E o Joint Stock Co. tinha nos vocais uma de suas melhores armas. Afinal, haviam cinco para dividir as vozes. Com o instrumental também afiado, a banda encarou os Analfabitles no palco do Casa Grande e, na Zona Norte, dividiu vários shows com as principais bandas da região, os Red Snakes e os Famks (futuro Roupa Nova).
No início de 1969, com a saída de Mário, que foi estudar teatro, e de Jorge Roberto Sá, o Joint Stock Co. agregou Sérgio Magrão e César de Mercês. Mas a nova fase não foi muito longe. Magrão, que integraria aquela clássica formação de O Terço, com Flávio Venturini, Sérgio Hinds e Luiz Moreno, teve que servir o exército, deixando o grupo capenga.
Insatisfeito com a situação, Jorge se encontra com o guitarrista Sérgio Hinds e com o baixista Robertinho (ambos do trio Os Libertos), a fim de tê-los como parceiros em sua nova empreitada. Da conversa, resulta porém um reformulado Os Libertos, que vira um quinteto com a exclusão de seu baterista e a entrada de Jorge, Vinícius e João (todos ex-integrantes do Joint Stock Co.). Mas, ao longo do ano de 1969, vários acontecimentos levariam o grupo a se transformar no trio que se lançaria pela etiqueta Forma (da Philips); teria participações memoráveis em festivais; e se consagraria, mais tarde (e com mudanças em sua formação), como uma das maiores bandas do rock brasileiro, O Terço.
Para abreviar uma longa história, o grupo seguiu para Corumbá, MS, onde passou meses se apresentando numa boate local, com esticadas eventuais à Bolívia e Campo Grande. Mas João e Roberto não ficaram muito tempo por lá. Mário voltou a assumir o baixo, posição que ocuparia temporariamente até o retorno do grupo ao Rio, no início de 1970. O fato é que os remanescentes Jorge, Sérgio e Vinícius já tinham um compromisso agendado com Paulinho Tapajós, com quem Sérgio Hinds se encontrara numa breve visita ao Rio. Paulinho estava começando a trabalhar com produção na Philips e mostrou-se interessado em ouvir o grupo.
Contudo, como o nome Os Libertos não havia sido do agrado de Paulinho, inclusive por soar desafiador em plena ditadura, o grupo resolveu se auto-intitular Santíssima Trindade. Enquanto ainda estavam em Corumbá, num encontro do grupo com o Padre Ernesto, velho conhecido da família de Amiden, ouviram dele que Santíssima Trindade não era um nome adequado para uma banda de rock. Na verdade, o padre deu um tremendo esporro (desculpe, Padre) em Jorge por causa disso. Quando acabou o sermão, olhou para o rosário que segurava nas mãos e disse: "Que tal batizar a banda com o nome O Terço?".
Embora Jorge tenha gostado do nome, Santíssima Trindade prevaleceu até cerca de abril de 1970, quando o primeiro LP do trio já estava quase pronto para ser lançado. Mas, por conta de um veto atribuído à censura, a banda finalmente passou a adotar o nome defendido por Amiden, O Terço, em substituição ao censurado Santíssima Trindade.
Junto com o novo epíteto, veio o LP de estréia, o primeiro e único de Amiden com o Terço (Forma VDL 116). Amiden assina nove de suas 12 faixas. Cinco em parceria com Hinds e as demais com diferentes parceiros. Um dos destaques é o apurado vocal do trio, preocupação constante de Jorge, cuja voz, em tom mais alto, completava o terceto.
Com um LP nas costas e o benefício de excelentes apresentações nos prestigiados festivais de Juiz de Fora (em junho de 1970) e no Internacional da Canção Popular (em outubro de 1970), a ascenção de O Terço foi muito rápida. No primeiro, venceram o certame com uma canção de Guttemberg Guarabyra e Renato Corrêa, 'Velhas Histórias'. E no segundo (o V FIC), obtiveram o 9o lugar com a lindíssima 'Tributo Ao Sorriso', de Amiden e Hinds.
Em 1971, seguindo no embalo dos festivais, com 'Mero Ouvinte', de Amiden e Cézar de Mercês, o Terço levou o prêmio de melhor arranjo (de Amiden) do IV Festival de Juiz de Fora. Já no VI FIC, o grupo obteve o 7o lugar com 'Adormeceu', também de Amiden e Cézar de Mercês. Foi nesse FIC que o quarteto (Cézar já fazia parte do grupo) apresentou ao público seus novos instrumentos: uma guitarra de três braços (tritarra) e um violoncelo eletrificado. A 'tritarra' foi idealizada por Jorge. Ele queria explorar diferentes timbres e possibilidades sem precisar ficar trocando de instrumento durante as apresentações. Sérgio entrou na onda de Amiden e também quis inovar, introduzindo o violoncelo eletrificado. Talvez assim os holofotes não apontassem apenas para Jorge.
Estranhamente, os desentendimentos começaram a brotar no núcleo do grupo, criando um antagonismo entre Sérgio e Amiden. Nessa época, Jorge Amiden era quem mais sobressaía, certamente gerando ciúme nos companheiros. Aos poucos, começou a se sentir isolado dentro do grupo. Sérgio e Vinícius, por exemplo, queriam enveredar pelo rock mais pesado e isso contrariava os desejos de Amiden. Além disso, Sérgio Hinds decidiu registrar a marca 'O Terço' em seu nome e sem o conhecimento de Amiden.
A atitude de Sérgio e dos companheiros deixou o guitarrista profundamente abalado. Encostado na parede, não teve alternativa senão largar o grupo que ajudou a fundar e lhe dar uma cara. "Fiquei traumatizado", diz Amiden depois de tanto tempo. Na verdade, um trauma jamais superado e de graves conseqüências, a começar pelo uso cada vez mais freqüente das drogas em sua fase pós-Terço.
O raro Karma
Todavia, Amiden logo encontrou novos parceiros. Com Luiz Mendes Junior (violão e vocal) e Alen Cazinho Terra (baixo e vocal), irmão de Renato Terra, o guitarrista daria início a sua trajetória de pouco mais de um ano como líder do Karma. Ramalho Neto, da RCA, não teve dúvidas em contratar a banda antes mesmo de ouví-la. Reconhecia o talento de Amiden e antevia um belo disco do Karma para a RCA.
E foi o que aconteceu. Pouco tempo depois, a RCA distribuía na praça o LP homônimo do Karma, uma obra antológica que merece constar de qualquer lista dos melhores discos da história do rock brasileiro. Com uma sonoridade predominantemente acústica servindo de base para a primorosa vocalização do trio, 'Karma' é recheado de canções brilhantes, como 'Do Zero Adiante' (Amiden e Mendes Junior), 'Blusa de Linho' (Amiden e Rodrix) e a revisitada 'Tributo Ao Sorriso' (Amiden e Hinds). Esta, levada quase até seu final em a capela, servia para realçar ainda mais a força vocal do conjunto. Vale destacar a participação do baterista Gustavo Schroeter (então integrante da Bolha), que ajudou a abrilhantar o disco com sua batida sempre consistente, arrojada e precisa.
E foi com Gustavo na bateria que o Karma fez o show de lançamento do disco no Grajaú Tênis Clube. Lamentavelmente, este pequeno tesouro concebido por Amiden jamais foi reeditado. Possivelmente hiberna nos arquivos da RCA desde o seu lançamento, em 1972, como hibernam tantas outras obras importantes nos arquivos das gravadoras brasileiras.
Em sua curta vigência sob a liderança de Amiden, o Karma ainda participou do VII Festival Internacional da Canção Popular, em setembro de 1972. Foi quando defendeu 'Depois do Portão' (Amiden e Mendes Junior). Em 1973, nos primeiros meses do ano, durante um show no Clube de Regatas Icaraí, em Niterói, depois de misturar bebida com drogas, Amiden perde o controle do próprio cérebro. O solo de guitarra parece interminável... Depois, sentado à beira da praia com Mário, se perde em plano existencial paralelo, vagando inseguro e solitário pelo lado escuro da lua.
Jorge só encontra a saída do enovelado e desconhecido labirinto no dia seguinte, quando percebe que o mundo não é mais o mesmo, o Karma não é mais o mesmo, a música não é mais a mesma...E nem sua vida seria mais a mesma. Dos palcos, se afasta...para na calma do tempo, quem sabe uma luz como guia, em dado momento, conceda algum dia seu retorno sereno.
Agradecimentos: Jorge Amiden, Mário Amiden e Mendes Junior.
http://www.youtube.com/watch?v=rDAaRBVt9-Q
grande musico brasileiro de rock progressivo uma pena que os jovens que tanto valorizam led zepelin,pink floid e outros saxonicos nao valorizam nosso progressivo rock por preconceito imbecil
ResponderExcluirVerdade, José Ailton! O preconceito às vezes é tanto, que muitos dizem não gostar sem ao menos escutar. abs
ResponderExcluirConheci Jorge Amiden na década de 90 morando em um sitio em Nova Iguaçu. Ele foi meu padrinho de casamento. Fui apresentado a ele por minha mulher que morava na localidade e era amiga da família.Eu era cantor da noite na época, me tornei amigo seu. Compusemos algumas canções, as ultimas da sua vida.Entre elas, Busca e Estação Primavera,gravadas por mim mesmo em um disco independente. É lamentável,mas Jorge morreu abandonado e passando até necessidades. Após a morte de sua mãe, sua situação piorou. Foi largado á propria sorte em um quarto nos fundos da casa grande do sítio, desprezado por sua irmã de criação, sem seus remédios controlados e outras coisas básicas na vida como roupas e até um par de chinelos para por nos pés. Absurdo e lamentável mas a pura verdade.
ResponderExcluirWagner,me desculpa... não sei porque acabei passando batido pelo seu comentário. Emocionante e triste, realmente! Mas que bom que você teve o privilégio de sua amizade! Grande abraço!
ExcluirMuito triste mesmo. Mas agora ele é uma estrela.!
Excluirestamos em 2017. tenho o disco do karma e ouço até hoje. maravilha ! acompanhei o início do terço com amiden, hinds e vinicius cantuária. tenho os discos (LP e compactos) da época. maravilha. o vocal da música "do zero adiante" é fabuloso !
ResponderExcluirGrande jorge
ResponderExcluirA mais pura verdade! Pena termos perdido esse talento!
ResponderExcluirUma pena realmente, Luciano Abreu!
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