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Carlos Drummond de Andrade na Da Vinci nos anos 80 |
Uma das últimas livrarias clássicas do Rio de Janeiro, a Leonardo da Vinci, que foi frequentada pela nata literária e intelectual, principalmente entre os anos 60 e 80, vai encerrar suas atividades nesse ano de 2015. Drummond foi um desses ilustres frequentadores e acabou fazendo uma poesia em homenagem à livraria ( que pode ser lido no final do post). Ocupando quatro salas de um edifício histórico da avenida Rio Branco, a livraria, fundada pelo romeno Andrei Duchiade há 63 anos, já cerrou as portas de duas delas e a partir de 1º de junho começará a liquidar seu estoque de livros de 60 a 80 mil títulos ( entre obras raras e estrangeiras). Seu espírito sempre foi o de uma empresa familiar - a herdeira Milena Duchiade é descendente do fundador - e sua especialidade a de manter à venda raridades e lançamentos fora da lista dos best sellers. Esse viés rebelde e autêntico não estava mais sendo rentável, frente à oferta fácil de livros na internet e as facilidades das megas livrarias instaladas nos shoppings. Nada contra as grandes lojas multimídia atuais, mas estabelecimentos como a Da Vinci deveriam ser considerados patrimônio histórico-cultural-intelectual e assim sendo, deveriam ser tombados, para quem sabe, permanecerem alicerçados como ícone cultural de uma época.
Livraria ( Carlos Drummond de Andrade)
Ao termo da espiral
que disfarça o caminho
com espadanas de fonte,
e ao peso do concreto
de vinte pavimentos,
a loja subterrânea
expõe os seus tesouros
como se defendesse
de fomes apressadas.
Ao nível do tumulto
de rodas e de pés,
não se decifra a oculta
sinfonia de letras
e cores enlaçadas
no silêncio dos livros
abertos em gravura.
Aquário de aquarelas,
mosaicos, bronzes,
nus,
arabescos de Klee,
piscina onde flutuam
sistemas e delírios
mansos de filósofos,
sentido e sem-sentido
das ciências e artes
de viver: a quem sabe
mergulhar numa página,
o trampolim se oferta.
A vida chega aqui
filtrada em pensamento
que não fere; no enlevo
tátil-visual de idéias
reveladas na trama
do papel e que afloram
aladamente dançam
quatro metros abaixo
do solo e das angústias
o seu balé de essências
para o leitor liberto.
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