Eu leio muito sobre HQ, e muitas vezes me deparo com personalidades da cultura e das artes que receberam influência dos quadrinhos em suas formações. Quando li na última semana um trecho sobre Paulo Leminski no livro "Guerra dos Gibis 2 - Maria Erótica e o Clamor do Sexo - Imprensa, Pornografia, Comunismo e Censura na Ditadura Militar", do incansável pesquisador Gonçalo Júnior, me veio o estalo: vou começar a postar essas referências! primeiro, porque geralmente partem de figuras que a priori não imaginamos que um dia foram fãs de gibis; e segundo, porque eses registros formarão um painel interessante para futuras consultas. Os quadrinhos, ao que parece, finalmente estão se firmando como arte e entretenimento sério aos olhos da sociedade. HQ nunca foi coisa só para criança, embora forças externas ( igreja, governo, pais, escola) sempre a colocassem como vilã, má influência e subliteratura. Da minha geração, de cada 50 amigos ( e a minha velha tchurma tinha por volta disso mesmo), cinco liam quadrinhos às vezes e outros cinco liam com frequência. 40 deles sequer tomaram conhecimento ou não puderam acompanhar as artes sequenciais impressas. Muitos pais rasgavam as revistinhas, muitos padres faziam discursos contra, muitos professores condenavam. Hoje - até que enfim - a diferença entre quadrinhos adultos e infantis está muito clara. Do começo do seculo XX até o início da década de 1980, fã de quadrinho era que nem sambista ( dos anos 20 aos 50) ou roqueiro (dos anos 60 aos 80) - invariavelmente tachado de vagabundo. Gibi deixava a mente preguiçosa. Grandes fãs desta nobre arte, principalmente jornalistas e fanzineiros, conseguiram reverter essa pecha e hoje livros, graphic novels e revistas de luxo repousam triunfais nas prateleiras das livrarias. O que precisa-se agora é salvar a velha banca de jornais e as revistas populares - mas essa é uma outra estória. Fiquemos com o Leminski, que abre essa série.
"... a jornalista e poetisa Alice Ruiz tornou-se editora de
Horóscopo Rose, com circulação mensal, que teve em seu marido, o poeta Paulo Leminski (1944-1989), um colaborador importante e assíduo. Principalmente na produção de roteiros para histórias em quadrinhos sobre o tema. Leminski era um apaixonado por histórias em quadrinhos desde a infância. Adorava ler gibis durante a madrugada. De preferência, de terror, da La Selva. Não perdia um número de
O Terror Negro, Histórias do além e Sobrenatural. "Ele tinha um certo fanatismo pelos quadrinhos de horror. Quando nos conhecemos, possuía uma pilha de gibis que vinha colecionando desde menino", relembrou a ex-mulher. A mãe do poeta lhe contou que era comum, na alta madrugada, ela acordar e ver luz no corredor. Como dormia no mesmo quarto do irmão, Paulo não acendia a luz para não acordá-lo. Quando todos iam dormir, ele pegava os gibis e virava a noite no corredor."
( trecho do livro "Guerra dos Gibis 2 - Maria Erótica e o Clamor do Sexo - Imprensa, Pornografia, Comunismo e Censura na Ditadura Militar", de Gonçalo Júnior - Editora Peixe Grande - 2010).
ps: só para situar, esse trecho se refere ao momento em que a Grafipar, famosa editora de Curitiba, estava iniciando sua produção nos quadrinhos e em poucos anos faria história nesse gênero.Leminski e Alice Ruiz colaboraram com a editora nesse período.