Estava eu na semana, sentado na cadeira do dentista da família, o grande Sergio Garcia, especialista em Imigração Italiana, Ocultismo e Catimbó, quando o assunto, que já tinha sobrevoado e mergulhado sobre Mario de Andrade, História do ABC, árvore genealógica, construção da Via Anchieta, fotografia, Câmara Cascudo, política e J.J.Benitez, entrou ligeiramente no foco "excêntricos da MPB" (na acepção ampla do termo), o que fez vir à baila os nomes de João Gilberto, Belchior e claro, Geraldo Vandré. Quando citei o isolamento do mestre sessentista Vandré, eis que Sergião larga o motorzinho pendurado no ar e de supetão, adentra a sala ao lado do consultório. Volta em menos de um minuto com esse clássico acima em mãos, "Das Terras do Benvirá", de 1973. Um disco que a primeira ouvida, pode causar estranheza a quem o conhece pelas canções de festivais anteriores. Gravado no exílio, por volta de 1970 ( não se sabe ao certo as datas das gravações) e só lançado por aqui em 1973, o LP traz sussuros, lamentos, gritos, quase como pedidos de socorro de quem sequer podia se manifestar ao vivo. O violão rascante está aqui, mais arrastado, é verdade, e as letras sociais também, embora nesse caso, debiquem para temas menos políticos e mais "existenciais" e desesperançosos. Já durante esse lançamento, Vandré era um cidadão do mundo, exilado, isolado e cada vez mais longe da música popular e de qualquer declaração sobre seu passado ou sobre possíveis torturas a sua pessoa por parte da Ditadura. Num revestrés que assustou muita gente na época e suscitou lendas absurdas (ou nem tão), o compositor chegou a gravar uma homenagem às Forças Armadas e negar seu passado de protesto, isolando-se cada vez mais para dentro de si mesmo, num silêncio profundo que dura até hoje. Esse discaço, que o Sérgio carinhosamente me presenteou ( e terá volta, com um Câmara Cascudo do meu acervo) é de certa forma, a despedida informal desse grande compositor ao formato de canção que o projetou. Hoje, 12 de setembro, três dias depois desse presente inusitado, Geraldo Vandré está completando 78 anos.