Vou inaugurar essa nova série - que surgiu após a leitura do livro "Discoteca Básica - 100 Personalidades e Seus 10 Discos Favoritos", com organização de Zé Antonio Algodoal - com a seleção totalmente emocional dos meus 12 discos preferidos. Se fosse uma seleção mais racional eu tinha incluído Beatles, Pink Floyd, Gilberto Gil, Genesis, Tom Jobim, Free, The Who, Queen,The Cure, ou seja, favoritos que fazem parte da minha vida, mas que eu fui conhecendo aos poucos, sem baques ou queixo caído logo de primeira. Esses meus "12 discos preferidos" abaixo - sim, eu aumentei dois discos da ideia original e alterei "favoritos" para "preferidos" mesmo sabendo que nada acobertará a minha cara de pau em prosseguir com o mote do antenado e bem relacionado Zé Antonio, ex-diretor da MTV e fundador do cultuado Pin Ups, mas também ciente de que essa ideia é compartilhada via magazines, blogs e redes sociais a muito muito tempo - são aqueles que vieram com tudo logo na primeira ouvida e esse "com tudo" pode ser uma iluminada no cérebro, uma explosão de sentidos, levitação corporal, êxtase profundo, etc. São discos que me comoveram de prima, me impressionaram de imediato, e que levaram essa impressão até o último minuto da última faixa, formando uma obra completa inesquecível que sempre volta para os ouvidos. Para se chegar a esses 12, deixei de lado muitos outros "preferidos", mas que por um detalhe ou outro acabaram limados da seleção definitiva. Alguns por não ter a coesão necessária de todas as músicas, outros por falta de espaço mesmo. E ainda teve aqueles artistas/bandas que eu adoro, como Tom Zé, Elis Regina, REM, Miles Davis, Noel Rosa, Billie Holliday, Elton John, Nick Drake, entre tantos, que eu sempre ouvi, mas de um modo mais solto, sem me concentrar em um disco completo. Da primeira seleção que elaborei, acabaram descartados esses todos: Elvis Presley (1956); Ella & Louis (1956); Miles Davis - Kind of Blue (1959); The Dave Brubeck Quartet - Time Out (1959); Getz/Gilberto (1964); John Coltrane - A Love Supreme (1965); Bob Dylan - Highway 61 Revisited (1965); Chet Baker - Baker's Holiday (1965); The Beatles - Revolver (1966); Quarteto Novo (1967), Tropicália (1968); Jimi Hendrix - Axis: Bold as Love (1968); Mutantes (1968); Van Morrison - Astral Weeks (1968); Led Zeppelin (1969); Rolling Stones - Let it Bleed (1969); King Crimson - In the Court of the Crimson King (1969); Free (1969); Blind Faith (1969); Black Sabbath - Paranoid (1970); Eric Clapton - Layla (1970); McCartney (1970); Tim Maia (1970); Bad Donato (1970); Janis Joplin - Pearl (1971); The Who - Who's Next (1971); Marvin Gaye - What's Going On (1971); The Allman Brothers Band - Live At Fillmore East (1971); Roberto Carlos (1971); Stevie Wonder - Talking Book (1972); Novos Baianos - Acabou Chorare (1972); Big Star - #1 Record (1972); Slade Alive! (1972); Genesis - Foxtrot (1972); Uriah Heep Live (1973); Pink Floyd - The Dark Side of the Moon (1973); Secos & Molhados (1973); Luiz Melodia - Pérola Negra (1973); Elis & Tom (1974); Jards Macalé - Aprender a Nadar (1974); Mahavishnu Orchestra - Apocalypse (1974); Gilberto Gil - Refazenda (1975); Rita Lee & Tutti Frutti (1975); Queen - A Night at Opera (1975); O Terço - Criaturas da Noite (1975); Creedence - Chronicle, vol.1 (1976); Cartola (1976); Ramones (1976); Stanley Clarke - School Days (1976); Beto Guedes - A Página do Relâmpago Elétrico (1977); Egberto Gismonti - Carmo (1977); The Police - Outlando's d'Amour (1978); Chico Buarque (1978); Zé Ramalho (1978); Van Halen (1978); Michael Jackson - Off the Wall (1979); Caetano Veloso - Cinema Transcendental (1979); Chic (1979); Oswaldo Montenegro (1979); Kiss - Dinasty (1979); Angela Ro Ro (1979); The Clash - London Calling (1979); Os Borges (1980); Manowar - Battle Hymns (1980); Donald Fagen - Nightfly (1982); The Cure - Concert (1984); Cantoria (1984); Stevie Ray Vaughan -Couldn"t Stand the Weather (1984); Ira! - Mudança de Comportamento (1985); O Adeus de Fellini (1985); Peble Rude -O Concreto Já Rachou (1985); The Smiths - The Queen is Dead (1986); Legião Urbana - Dois (1986); The Style Council - Cafe Bleu (1986); Titãs - Cabeça Dinossauro (1987); Kães Vadius - Pshycodemia (1987); Nei Lisboa - Carecas da Jamaica (1987); Patife Band - Corredor Polonês (1987); Aerosmith - Pump! (1989); Neil Young - Ragged Glory (1990); Red Hot Chili Peppers - Blood Sugar Sex Magik (1991); Thin Lizzy - Dedication...(1991); Black Crowes - The Southern Harmony...(1992); Geraldo Azevedo - Ao Vivo Comigo (1994); Marisa Monte - Verde, Anil, Amarelo, Cor de Rosa e Carvão (1994); Renato Russo - The Stonewall Celebration Concert (1994); Paulinho da Viola - Bebadachama (1997).
São 86 discos a mais! E se rolasse outra seleção amanhã, não só a lista definitiva seria outra, como esses sobressalentes também teriam muitos acréscimos. É assim mesmo: essa sadia brincadeira de escolher discos abre valas abissais que estão ali, guardadas entre o coração e a mente. Afinal, os discos são nossos aliados queridos por toda a vida.
A lista definitiva ficou assim (sem ordem de preferência):
1- Leno (feat. Raul Seixas) - Vida e Obra de Johnny McCartney (1970/1971)
Um divisor de águas na carreira de Leno ( que queria abandonar o bom mocismo da jovem guarda), de Raul Seixas ( produtor na CBS na época, começando a transpor para o disco sua porção Raul no lugar do compositor Raulzito de "Doce doce Amor" e rocks comportados) e do próprio rock nacional, que ficaria mais lisérgico, pesado e metafórico nesses anos pesados da ditadura. Mas os militares não queriam saber de contrarevolução na cultura e censurou boa parte das letras, a maioria de Raul. A gravadora, sem cerimônia, aproveitou a retaliação e acabou não lançando o disco. Inclusive avisou Leno que as fitas masters seriam apagadas. Mas em 1995, o pesquisador Marcelo Fróes (sempre ele) descobriu as fitas originais intactas e finalmente o disco foi lançado, com acréscimo de vocais e overdubs de instrumentos, pelo selo independente do próprio Leno, Natal Records (e depois relançado no exterior nos anos 2000). Me surpreendeu logo na primeira ouvida, pela postura desafiadora, o peso da banda A Bolha ( Rolling Stones até o osso), o pioneirismo da gravação em oito canais, as letras espertas e a unidade das faixas. Foi a primeira investida "in loco" de Raul Seixas em um disco pós-Panteras: na produção, nos arranjos, compondo, tocando e ajudando nos vocais.Um disco moderno até hoje, que merece ser mais conhecido.
2- Velvet Underground - Loaded (1970)
Geralmente os discos que aparecem nas listas por aí são o "Velvet Underground & Nico" (1967) e o "Velvet Underground (1969), ambos ótimos, mas o meu VU de cabeceira é esse último da formação clássica, onde a banda aparece mais desencanada do que nunca ( calejada pelos fracassos comerciais dos três últimos discos) e embora ainda subterrânea e ainda sob a égide do submundo urbano, acordes e vocais quase interceptam uma nesga de claridade. Disco perfeito para ouvir antes de qualquer noitada!
3- David Bowie - Hunky Dory (1971)
David Bowie aqui já era compositor do mega sucesso "Space Oditty", mas ainda estava tateando sua persona no show business. Foi nesse disco que ele se tocou que sua obra podia ter várias facetas e nessa transição anterior à explosão "Ziggy Stardust" construiu o primeiro disco realmente "fodaço". da carreira. Dessa amálgama bem engendrada surgiram clássicos instantâneos como "Changes", "Oh You Pretty Things", "Quicksand" e "Queen Bitch".
4- Jehtro Tull - Aqualung (1971)
Assim como o "Foxtrot" do Genesis, esse é o disco que me introduziu no mundo progressivo e me fez decorar cada respiração de Ian Anderson entre uma flautada e outra. A verdade é que o grupo só entrou na classificação "progressivo" para ser situado em algum subgênero do rock, pois a sua fusão de folk, blues, jazz, música clássica e hard rock sempre fundiu a cabeça de quem ousou classificá-lo. Uma boa introdução para quem acha que o rock não pode ser inteligente.
5- Milton Nascimento e Lô Borges - Clube da Esquina (1972)
Talvez o disco que eu mais tenha ouvido. Eu já conhecia algumas músicas, mas depois de ler o ótimo livro do letrista Márcio Borges "Os Sonhos Não Envelhecem" resolvi mergulhar na história do Clube da Esquina e consequentemente ouvi à fundo todos os grandes clássicos do movimento, desde o embrionário "Milton" de 1970 até o familiar "Os Borges" de 1980. Esse primeiro Clube da Esquina ( também existe o Clube da Esquina 2 de 1978) impressiona a cada ouvida: os arranjos e orquestrações, as texturas jazzísticas , as referências históricas, as metáforas políticas, os efeitos vocais, as participações especiais, o revezamento dos músicos em vários instrumentos, e principalmente, o entrosamento único que fez desse disco um dos mais coesos e emocionantes da vasta discografia brasileira. Não à toa, é um dos mais cultuados entre os músicos estrangeiros, até hoje.
6- Rolling Stones - Exile on Main Street (1972)
Quem me conhece sabe que eles não podiam ficar de fora da minha lista e nessa seleção, a inclusão de qualquer lançamento dos Rolling Stones entre 1968 e 1972 seria perfeitamente coerente, pois foram os anos mais intensos da banda de rock mais antiga do mundo. Fico com o "Exile", considerado o melhor por muitos stonemaníacos, por ser um disco que sempre oferece novas leituras a cada mergulhada. Nessa época o grupo fugia dos impostos na França e boa parte das gravações foram feitas nos porões de um casarão, transparecendo nas músicas esse clima claustrofóbico. Junte a essa atmosfera de pub, blues, soul, rock and roll, rythm and blues, spirituals, vocais gospel, sinergia perfeita de instrumentos, guitarras afiadas e agressivas, uma das melhores performances de Mick Jagger, e eis um disco impressionante.
7- Sá, Rodrix & Guarabyra - Terra (1973)
Junte três versáteis instrumentistas que compõem e mandam muito bem também nos vocais. Acrescente uma nova vertente, praticamente criada por eles: o Rock Rural, um subgênero que junta rock progressivo, toada mineira, folk, Beatles, country e folclore nordestino. Desse caldeirão surgiu o trio Sá, Rodrix & Guarabyra, que em dois discos apenas pela EMI ( esse e "Passado, Presente e Futuro de 1972) fizeram um som inovador, com instrumentação e qualidade de gravação no mesmo nível do que se fazia no rock internacional à época. Além de instrumentos "exóticos" como ocarina, craviola, conga, ganzá, chicote e madeira ( esses quatro últimos para formar uma verdadeira banda de pífanos em "Pendurado no Vapor"), o trio permeia tudo com cordas tradicionais e o órgão Hammond de Rodrix para as partes quentes. No auxílio luxuoso, Moreno e Magrão ( aqui chamados de Luiz Morenão e Sergio Magrelo), que entrariam em seguida para O Terço. Um disco imprescindível para se conhecer a evolução do rock brasileiro.
8- Sérgio Sampaio - Eu Quero Botar Meu Bloco na Rua (1973)
Um disco que me pegou pela carótida. O irrequieto e arredio Sérgio Sampaio lançou esse disco na rabeira do megasucesso "Eu Quero Botar Meu Bloco na Rua", que estourou em vendas como compacto. Inesperadamente, o LP não vendeu o que a gravadora imaginara, talvez porque o Sampaio criador fosse muito mais complexo e dinâmico do que a marchinha popular antevia. No auge da forma, o compositor capixaba, amigo de Raul Seixas ( com quem cometeu o anárquico "Sociedade da Grã Ordem Kavernista Apresenta Sessão das 10) desfila em doses proporcionais, sambas, marchas, blues, arranjos psicodélicos e letras corrosivas e dilacerantes ( sem perder o humor negro). Sampaio nunca mais conseguiu reaver o sucesso comercial do compacto, muito pelo seu gênio irredutível, mas também pela visão míope das gravadoras. Hoje, a geração da internet (graças a abnegados como Sérgio Natureza e Zeca Baleiro) vem redescobrindo seu legado e o colocando no patamar dos maiores criadores da nossa música brasileira. Nada mais justo. Maldito é a p....
9- Itamar Assumpção - Beleléu Leléu Eu (1980)
Esse disco, na minha humilde opinião, é um dos mais revolucionários da música brasileira. Tanto, que até hoje ninguém conseguiu decifrar totalmente seus códigos. Moderno até hoje, conta com a blindagem musical da Isca de Polícia ( e não por coincidência, um de seus integrantes, Paulo Barnabé, cometeria outro disco revolucionário oitentista, o "Patife Band - Corredor Polonês") e a malícia, a teatralidade, a poesia e o impacto discursivo do mentor Itamar, muito bem acompanhado pelos vocalizes femininos sempre presentes em sua obra. Beleléu tem postura rap muito antes do rap, e a mistura de ritmos ( que não chega a ser samba, nem rock, nem blues, nem jazz, mas é isso tudo) aliada à crônica de costumes da cidade periférica faz de Beleléu Leléu Eu o grito primal da Vanguarda Paulista e um petardo fumegante apontado para o futuro.
10- Tom Waits - Rain Dogs (1985)
Conhecia o bardo Tom Waits de nome, mas quando botei a agulha nesse "Rain Dogs", logo que o disco saiu, enlouqueci. New Orleans, bourbon, serenata, inferninho, vaudeville, cortiço, pântano, beco, boemia, gim, gigolô, prostituta, blues, bar, coração despedaçado, hotel barato, bêbados, gato preto, e por aí vai: as criaturas e paisagens noturnas das composições delirantes saem da garganta arranhada de Waits enquanto por detrás, uma big band propositadamente desconjuntada tenta unir os estilhaços. Gutural e profundo, é o que se pode dizer do grande Tom Waits, e esse disco o pegou no ponto certo entre o underground e o mainstream, trazendo o seu nome para o letreiro luminoso da música mundial.
11- Travelling Willburys - Vol.1 (1988)
Uma festa! depois de uma descontraída reunião entre Bob Dylan, Tom Petty e Roy Orbison para gravar o single"Handle with Care" do LP "Cloud Nine" de George Harrison, os quatro gostaram do resultado e juntos a Jeff Lynne ( ex-ELO e produtor de George) formaram a banda Travelling Wilburys em outubro de 1988, todos com seus devidos pseudônimos ( membros da família Wilbury). O veterano Roy faleceu em dezembro, mas a tempo de ver o sucesso e a repercussão do disco. Merecidamente, pois todas as faixas foram feitas com muita paixão. Uma reunião desse quilate poderia ter sido um fiasco ( vide histórias anteriores com supergrupos) ao unir egos dilatados, mas a paixão comum pelo rock and roll e a música estradeira fez com que todos se esbaldassem, se divertissem e fizessem músicas apaixonantes e iluminadas. Além de tudo, um era fã do outro, e juntos, fizeram um dos discos mais ensolarados dos anos 80.
12- Guinga e Aldir Blanc -Simples e Absurdo (1990/1991)
Eu já acompanhava o Aldir Blanc desde o seu início de carreira, ainda com a turma do MAU (Movimento Artístico Universitário), quando compôs a maravilhosa "Amigo é Pra Essas Coisas" em parceria com Silvio da Silva Jr. e logo engataria uma fértil parceria com João Bosco que renderia clássicos absolutos. O Guinga eu conhecia por nome, e sabia ser ele um violonista dos melhores, que já tinha gravado com bambas do choro e do samba, mas que nos últimos tempos voltara exclusivamente para seu consultório de dentista. Quando vi esse disco juntando os dois, comprei na hora. E não me arrependi! Com participações marcantes como Chico Buarque, Cláudio Nucci, Zé Renato, Leny Andrade ( um espetáculo!), Leila Pinheiro, entre outros, a obra traz crônicas contundentes, delírios poéticos e cordéis absurdos do sempre incisivo Aldir Blanc em músicas singulares, onde a melodia foge do padrão e sua construção trai os ouvidos, ora tensa, ora suave, ora atingindo o silêncio em uma nota inexistente. Uma obra surpreendente, dinâmica, que merece um estudo sério da crítica especializada.
Taí os 12 discos, que com muito custo consegui publicar. Não percam as próximas seleções vindas de grandes discófilos e fãs da boa música! Muita coisa boa vem por aí...
Malu, sensacional!!Acho que colocaria boa parte na minha lista! Beleleu e Clube da Esquina certamente. Aldir Blanc, adoro. Sá Rodrix e Guarabira, tb, mas acho que colocaria o LP que leva o nome dos 3. Enfim, Tom Waits, VU, Stones, tua cara. do Leno não conhecia. vou pesquisar. Maravilha
ResponderExcluirPow, Gi, estava fuçando meu blog e dó vi agora essa sua resposta! Temos gostos parecidos, meu amigo! Viva a música boa!
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