29 de abril de 2013

Paulo Vanzolini (1924-2013)

LP de 1981, o primeiro em que cantou suas próprias composições
Acabei de colocar o CDzinho nº 16 da Coleção Raízes da Música Popular Brasileira da Folha, para escrever esse post sobre o grande Paulo Vanzolini, falecido ontem na cidade que tanta adorava. A primeira vez que botei o ouvido em alguns de seus sambas milimétricos foi nos anos 70, ao fuçar na coleção de fascículos do meu pai, lançada pela Abril Cultural com a história da nossa MPB. Numa talagada só, do alto dos meus 10,11 anos, conheci mais a fundo a obra e a história de monstros sagrados como Chico Buarque, Ismael Silva, Cartola, Lupicínio Rodrigues, Noel Rosa, Nelson Cavaquinho, entre tantos outros que saíram na série. Um dos fascículos focava dois autores paulistanos, na vida real amigos: Adoniran Barbosa e Paulo Vanzolini. Ali, no mini-LP com músicas de ambos - que embora vivessem tomando uma branquinha juntos, jamais fizeram um samba juntos - eu conheci dois dos mais gabaritados estilistas do samba paulista, um samba bem diferente do carioca, por sinal. Me apaixonei na hora por aquelas letras cheias de referências à cidade da garoa e seus habitantes multifacetados e melodias tão densas e sincopadas. Decorei várias daquelas músicas e passei a cantá-las pela vida afora. Uma das minhas preferidas era Samba Erudito, maravilhosamente escrita e musicada por mestre Vanzolini:

Samba Erudito
Paulo Vanzolini

Andei sobre as águas
Como São Pedro
Como Santos Dumont
Fui aos ares sem medo
Fui ao fundo do mar
Como o velho Picard
Só pra me exibir
Só pra te impressionar

Fiz uma poesia
Como Olavo Bilac
Soltei filipeta
Pra ter dar um Cadillac
Mas você nem ligou
Para tanta proeza
Põe um preço tão alto
Na sua beleza

E então, como Churchill
Eu tentei outra vez
Você foi demais
Pra paciência do inglês
Aí, me curvei
Ante a força dos fatos
Lavei minhas mãos
Como Pôncio Pilatos

Cantei muito essa pérola, principalmente com meu parceiro de roda de violão Rick Berlitz. Depois fiz questão de citar o mestre em um de meus poemas ( que irá sair em uma antologia ainda este ano). Em duas longas entrevistas entre 2010 e 2011 com dois especialistas da MPB, Zuza Homem de Mello e Pelão ( João Carlos Botezelli), para uma pesquisa sobre a Gravadora Marcus Pereira (inéditas - o livro, do M.Mazuras, iria sair pela Lei Rouanet mas não foi aprovado), a frequência do nome Vanzolini foi inevitável - seu primeiro disco autoral, pelo selo (ainda com o nome de Jogral) saiu apenas em 1967 (e cantado por outros artistas). Boêmio convicto (até o fim da vida), bares como o Jogral nos anos 60 eram sua segunda casa e neles mostrava suas composições ao vivo - como não lia música, muitas ficavam no subconciente dos frequentadores e amigos e só eram gravadas muito tempo depois ( e às vezes nem eram). O samba e a cachacinha eram seus hobbys - a profissão mesmo sempre foi zoólogo, atividade que lhe rendeu prêmios e prestígio. Mas pérolas eternas como Ronda e Volta por Cima e outras jóias raras menos conhecidas mas também brilhantes, ficarão para sempre nas rodas, mesas e casas onde se ouve samba/música de respeito e sem obviedades.
Segue um dos melhores perfis do compositor, escrito em 2012 pela competente jornalista Ana Ferraz:
http://www.cartacapital.com.br/cultura/a-sabedoria-do-boemio-2/

2 comentários:

  1. muito bom o comentário
    É uma pena que estamos perdendo vários compositores e cantores da nossa boa música brasileira, e o pior ainda que ficam essa gerações novatas que estão acabando com a nossa música.
    Fica essa porcaria de universitásios

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  2. Obrigado. Na verdade tem gente boa na nova geração, mas infelizmente a maioria fica escondida ou fora da mídia. Enquanto isso, programas de auditório escancaram o que temos de pior.
    abs

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